▷ 5 Melhores Poesias de Fernando Pessoa

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Aqui está uma seleção incrível de poesias de Fernando Pessoa para inspirar você.

Selecionamos os 5 melhores poemas desse grande autor. Confira logo a seguir.

A tabacaria

Não sou nada

Nem nunca serei nada

Nem posso querer ser alguma coisa

À parte disso, em mim eu guardo todos os sonhos desse mundo

Janelas da minha casa

Da minha casa de um dos milhares do mundo

Que ninguém consegue saber quem é

E se soubessem, o que é que saberiam?

É um mistério no meio dessa rua que é sempre cruzada por tantas pessoas

Uma rua inacessível a tantos pensamentos

Real, de uma forma impossível, mas certa, de forma desconhecida

Carregada de mistérios por entre as pedras e os seres

Com a morte a umidade das pareces

E os cabelos brancos de mulheres e homens

Com a destino a ser conduzido numa carroça rumo ao nada

Hoje estou vencido, como se tivesse descobrindo a verdade

Hoje estou lúcido, como alguém que está pronto para morrer

E já não tivesse alguma irmandade com nada

Senão uma breve despedida, desta casa e deste lado da rua

Em meio a fila de carruagens que partem num apito

De dentro da minha própria cabeça

E aquele ranger das ferragens e a sacudida nos nervos

Sinto-me perplexo, como quem pensou, e achou e esqueceu

Dividido entre a lealdade que carrego

E a tabacaria da esquina, como algo real por fora

E ainda a sensação de que não passa de um sonho, de algo real por dentro

Falhei em praticamente tudo

Já que não tive nenhum propósito, então tudo virou nada

A aprendizagem de que me deram

Desci dela pelas janelas dos fundos da casa

Poema escrito em linha reta

Nunca conheci alguém que tivesse levado porrada

Talvez os meus conhecidos sejam apenas os campeões de tudo

E eu, que por muitas vezes reles, tantas vezes porco e até vil

Eu que, tantas vezes como um parasita irresponsável

Sujo

Eu, que tantas vezes perdi até a paciência de tomar banho

Eu, que tantas vezes absurdo e ridículo

Que enrolo os pés publicamente nos tapetes que exigem etiqueta

Que tão grotesco, submisso, mesquinho e arrogante

Que sofro calado enxovalhos

E quando não me calo, sou ainda mais ridículo

Eu que, as criadas do hotel tenham sido cômicas

Eu, que sinto o piscar de olhos dos moços que fazem frete

Eu, que tenho vergonhas financeiras, e que pego emprestado e não pago

Eu, que no momento do soco, lobo me agacho

Pra longe do soco, desviando

Eu, que tenho sofrido a angústia das coisas que são ridículas

Todas pessoas que conheço e que falam comigo

Nunca tiveram um ato ridículo, nunca sofreram enxovalho

Nunca fora, senão príncipes, todos príncipes na vida

Quem me dera então ouvir de alguém uma voz humana

Que confessasse pecados e infâmias

Que contasse, não violências, mas covardias

Não, são todos o ideal, aqueles que me falam

Quem neste mundo que me confesse que ao menos uma vez já foi vil?

Meus irmãos, meus príncipes

Estou farto dos semideuses

Onde é que há gente de verdade nesse mundo?

Ou será que só eu sou vil e errôneo?

Poderão as mulheres então, não amarem

Terem sido traídas, mas ridículas nunca foram

E eu que sou ridículo sem ter nem sido traído

Como posso ir a falar com meus superiores e não titubear?

Eu, que tenho sido literalmente vil

Vil no sentido mais mesquinho e infame

Auto psicografia – Poesia de Fernando Pessoa

O poeta não passa de um fingidor

Ele finge de forma tão completa

Que chega até fingir a dor

A dor que nem mesmo sente

Mas sente quem os leem

E na dor lida se sentem bem

Não as dores que eles têm

Mas a que eles não têm

E dessa forma nas calhas da roda

Gira e entretém a razão

Nesse comboia de cordas

Que chamam de coração

Não sei quantas almas eu tenho

Não sei quantas almas eu tenho

Mudei em cada momento

Vez em quando me estranho

Nunca me vi e nem acabei de ver

De tanto que eu sou, só tenho alma

E aquele que tem alma, jamais tem calma

Quem vê é só aquilo que ele vê

Mas quem sente não é aquilo que é

Atento aquilo que sou, eu vejo

Torno-me ele e não sou apenas eu

Cada sonho ou desejo

É daquilo que nasce, não meu

Eu sou a minha própria paisagem

Assisto á minha passagem

Móbil, diverso e só

Não sei sentir a mim mesmo onde eu estou

Por isso, vou lendo

Como as páginas do meu ser

O que segue não pode ser previsto

O que passou se pode esquecer

Noto nas margens do que li

O que eu julguei ou senti

Releio: mas será que fui eu?

Deus sabe, porque ele o escreveu.

Todas as cartas – Poesia de Fernando Pessoa

Todas as cartas escritas de amor são

Ridículas

Se não fossem de amor, não seriam

Ridículas

No meu tempo também escrevi estas cartas

Que assim como as outras,

Ridículas

Tem que ser essas cartas

Ridículas

E, afinal,

Apenas aquelas criaturas que nunca escreveram

Uma carta de amor

É que são, na verdade,

Ridículas

Ah! Quem me dera no tempo em que eu escrevia

Sem dar nada por isso

Cartas de amor tão

Ridículas

A verdade é a de que hoje

As minhas memórias

De tais cartas de amor

São

Ridículas

Todas os termos esdrúxulos

E os sentimentos esdrúxulos

São todos

Ridículos.

Colhe o teu dia porque você é ele

Alguns, de olhos postos sempre no passado

Veem aquilo que não veem, enquanto outros, fitos

Com seus olhos no futuro, veem

Aquilo não pode ver-se

Por que ir para tão longe pelo que estão tão perto

A nossa segurança é esse dia

Esta é a hora e este é o momento, e isto

É quem somos, e é tudo

A interminável hora fluir perene

E nos confessa nulos, neste mesmo hausto

No que vivemos, também morremos, então colhe

Colhe o teu dia porque você é ele

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